domingo, 18 de novembro de 2012

Página do diário da Joana R

“... cheias de mulheres que vestem por igual.”

            Desço aquela escadaria sem fim do costume, entro na carruagem, e fico com a sensação que mil e um olhares têm as objetivas focadas em mim. As caras quase inanimadas revelam a exaustão de mais um dia.
            Saí na minha estação, e um mar de gente apoderou-se do chão branco que existia, apoderado por aquelas cores escuras e sombrias das vestes.
            Uma jovem trazia um casaco com cores chamativas; por onde quer que passasse, os olhares curiosos seguiam-na, como se fosse censurada em tempo de ditadura.
            A meu lado estava uma criança com a pele delicada e de barriga cheia que se levanta de uma forma teatral dizendo: “- As mulheres vestem por igual”.

Joana Rodrigues

Página do diário do Tomás



Beleza de um mordaz sentido
Expectativa sinalizam A estranheza
Paradigma esquecer da Ninguém.
O resto sempre perde
O resto mundo cruzador
Presença do regra a pródigo
Premiado, morto pelo verso
Em Dividido exaustivo dissecar
Suscitada culpa do que para um
O faz no a um.
Poema dadaísta
Tomás Neves

Página de Diário da Inês Duarte




“Arquipélagos”

O Homem é uma ilha. Nessa ilha está uma árvore. A madeira dessa árvore serve para construir meia ponte. Só meia! Essa ponte serve para chegar a outras ilhas, mas só fica completa se a outra ilha construir a outra metade.
As grandes ilhas são aquelas que têm a mania de chegar a toda a gente; a árvore delas cresce muito depressa e a ilha também, para ter espaço para todas as pontes.
Então e existem ilhas sem pontes? Não. Quando uma ilha se forma, já vem com pontes de ferro e passado algum tempo, quando a árvore cresce tudo o que tem para crescer, começamos a construir as nossas próprias pontes.
E as pontes velhas, não caem? Não. Nós é que as desconstruímos quando já não há hipóteses de elas ficarem de pé.
Se o Homem é uma ilha, as suas relações são pontes e é assim que se formam arquipélagos.


UMa página do Diário Literário da Inês Gomes

“Dentro dele cabe Tudo”

Era um Homem em que tudo cabia dentro de si.
Ele não via o mundo, ele consumia-o
Ele não usava meras palavras, ele construía-as,
Enquanto os outros perseguiam as suas vidas, ele procurava novos trilhos para a sua.

Dentro dele cabia Tudo.
As ruas, a cidade, o Mundo.

Até que um dia já não cabia nada,
Saiu tudo cá para fora.
O Homem começou a escrever
Criou palavras, criou frases, criou textos
Criou Tudo

Inês Gomes

Comilões: Diário de uma aula do Francisco

Comilões
            -Os números pares estão em vantagem, não é justo. A professora disse que só avisava no final da aula, e está a avisar no início!
            E assim começa a aula, discussão tremenda sobre avisos prévios que não deviam ter sido avisados. Houve muita confusão até aparecer o “africano”, ninguém sabe muito bem de onde ele apareceu, mas que apareceu e acalmou, apareceu e acalmou! Uns dizem que veio de afer, outros de aprygah, alguns de awrigha e até há os que dizem de aphriké, cada um puxa o seu cordelinho e ficamos assim… africano aparece, africano acalma, africano vai-se embora… dando assim lugar a Saramago (metonímia mais tarde aprendida). Este escreveu na primeira frase lida do seu Memorial: -“Assim mal tratadas as carnes, alimentadas de magro…”
            Alimentadas de magro?! Logo depois falamos de anástrofe, hipérbato, hipálage, sinédoque, metonímia, composição morfológica, composição morfossintática, classe de palavras, classe aberta de palavras e nomes (próprios, comuns, coletivos, contáveis e não-contáveis), e Saramago escreve “Alimentadas de magro”!

Francisco Pinto

Página do diário de Sofia



        Saramago? Porquê Saramago agora? Em cada aula, cada palavra vinda daquela mulher delicada, de cabelos brilhantes e robustos, com uma voz suave que faz com que a articulação de cada palavra seja uma onda de som que nos entra no ouvido e nos acalma.
         Visto que o velho senhor até é bastante culto, mas utiliza palavras de um nível elevado que me faz contorcer o cérebro, até que tenho cãibras.
         Mas até lhe agradeço, senhor Saramago, por me fazer ler cada página sua 3 vezes para entender o 1º e 2º parágrafo.